25.9.05

Um presidente evangélico não é a salvação do Brasil

Toda alma esteja sujeita às autoridades superiores; porque não há autoridade que não venha de Deus; e as que existem foram ordenadas por Deus.

Romanos 13:1


Quebrando o meu silêncio de semanas, queria comentar algo que vi recentemente, sobre o sr. Anthony Garotinho, secretário de governo do estado do Rio de Janeiro e pré-candidato à presidência da República em 2006. O ex-governador é presbiteriano, professor de escola dominical e militante ativo da fé cristã.


Não, não vou gastar meu tempo aqui dizendo se ele é um bom ou um mau candidato, se ele é um político competente ou não, se é corrupto ou não. Tenho uma opinião formada quanto a ele, mas não quero decliná-la aqui, pois meu objetivo não é falar de política, mas sim do meu povo, os evangélicos.


O que me tornou pensativo foi ao observar uma entrevista dele na televisão, num programa de famoso pastor, falando sobre uma armação feita para ele, dizendo que ele comprou votos para o seu candidato na última eleição muncipal, na cidade de Campos dos Goytacazes, sua cidade de origem. Foi exibida uma reportagem da revista Isto É, falando da armação feita contra ele, e ele falou do pedido que fez, perante a Justiça, de que essa emissora de TV dê a ele o direito de resposta, apresentando o homem que o acusou, desmentindo tudo. Bem, estamos num estado de direito, ele tem o direito à defesa, e ao contrário do que muitos agem, todas as pessoas são inocentes, até que se provem o contrário.


Ele é um óbvio candidato à presidente em 2006, e em algumas pesquisas o nome dele desponta na liderança, caso o atual presidente não concorra à reeleição. A sua liderança nas pesquisas me preocupa, não por causa dele em si, mas sim por causa do povo evangélico. Explico:


Antes de tudo, vale citar o sociólogo cristão Paul Freston, em artigo na revista Ultimato, na sua edição no. 278: um presidente evangélico de país latino-americano que era general; chegou à presidência via um golpe militar e conduziu a mais sangrenta repressão que aquele país conturbado já conheceu. (...) E, para dar um exemplo particularmente chocante, o atual secretário particular do presidente da África do Sul é um pastor pentecostal que já foi vice-presidente da sua denominação. Nos tempos do apartheid, ele foi preso por visitar os irmãos da igreja que estavam presos e, na prisão, foi torturado por um diácono da sua própria denominação! (para o artigo completo, clique aqui). O que o autor fala aqui é muito forte: Temos evangélicos em todas as posições políticas, do fascismo ao anarquismo (não anarquia). Conheço gente nos extremos e no meio, de posições diversas. Logo, um candidato evangélico nunca será unânime, quem quer que ele seja. Lembrem-se que a Klu Klux Klan, organização racista estadunidense, é de extrema direita, e em grande parte composta por evangélicos (inclusive pastores).



  1. O que quero dizer, em primeiro, é que ter um presidente evangélico não é sinônimo de um país abençoado especialmente por Deus. Vale citar (novamente) a Ultimato, de setembro/outubro de 2002: Se todos os 26 milhões de evangélicos brasileiros fossem o bom perfume de Cristo (2 Co. 2:15), o sal da terra e luz do mundo (Mat.5:14), o Brasil forçosamente e com certeza seria outro. Esse comprometimento real com Jesus Cristo é muito mais importante do que um PRESIDENTE EVANGÉLICO. Não é que se um presidente é evangélico que o país será mais abençoado que outros. Na Guatemala o presidente era evangélico e deu um golpe de estado; na Coréia do Sul, o presidente era evangélico e sofreu protestos contra o seu governo (muitos iniciados por estudantes que professam a mesma fé que ele). Sem contar os exemplos que eu citei acima. Logo, votar em Anthony Garotinho somente por que ele é evangélico... É muito pobre. Certa vez ouvi de uma pessoa culta, profissional da área de exatas: Ah, se eu não votar nele, em quem eu vou votar? Respondi que em qualquer um dos outros candidatos, ora. Já votei em candidatos umbandistas, mas não por sua postura religiosa, mas por sua capacidade administrativa e legislativa. E qual é o problema nisso? O Brasil precisa de que os evangélicos façam diferença. Afinal, se 1/7 da população do Brasil, (assim dizem estatísticas um pouco exageradas), por que o país continua do jeito que está?
  2. Outro medo que tenho é o povo evangélico em si. Não é preciso ser muito esperto para perceber que, teremos uma ditadura velada do povo evangélico sobre todos os outros povos. É líquido e certo: Ouviremos muitos discursos de "domínio territorial", de "quebra de maldições vindas do tempo de que éramos colônia", "agora nós vamos mandar no Brasil", entre outras sandices. Se alguém conhece A Revolução dos Bichos, de George Orwell, pode lembrar-se do que aconteceu: Os porcos, que eram oprimidos, tornaram-se ditadores, os opressores da granja. A mesma coisa ocorrerá no Brasil. E o meu medo é agora, os evangélicos, como povo, achar que agora mandam no Brasil, e aí... Coitados dos não- evangélicos: umbandistas, espíritas, praticantes da Nova Era... Até católicos terão problemas. Se bobear vai ter gente querendo perseguir outras matizes religiosas e usar a máquina do Estado para isso. Teremos evangélicos se metendo onde não foram chamados, tornando o nosso Brasil um país mais anacrônico. Tudo com um pretexto de que "o presidente é evangélico". Eu tenho medo do povo evangélico no poder, como tenho medo de qualquer povo oprimido quando toma o poder. Mete a cara no melado e se lambuza todo.
  3. Meu terceiro medo é que aí teremos caravanas de pastores indo a Brasília pedir favores. O que vai ter de gente batendo na porta do Palácio do Planalto, caso tenhamos um possível presidente evangélico... Não vai ser brincadeira. Se os políticos evangélicos se reúnem apenas para discussões ridículas como colocar Jesus como o padroeiro do Brasil, lutas contra leis pró-aborto, anti-homossexuais e coisas assim, não é de espantar que teremos coisas ainda piores. Vai ter pastor achando que colocar o próprio nome numa praça da sua cidade é razoável, vai ter liderança que vai querer auxílio financeiro do governo (poderiam alegar que a CNBB recebia apoio financeiro - o que é errado, se o Estado é laico)... Mil e uma aberrações. E se não atenderem, aí vai ser pior. Com certeza irão, nas suas comunidades e congregações, falar mal daquele que virou para eles e disse: "Não, infelizmente não dá". Sim, teremos muuuuitos pastores que se não forem atendidos nos seus desejos egoístas, para encher o seu próprio estômago, irão fazer campanha contra o presidente. Não duvide, porque o povo evangélico é bem... Complicado.



Não, não sei se o sr. Anthony Garotinho é o melhor ou não. Me omito de dizer. Só peço que Deus oriente o povo e escolham um governante realmente direcionado por Ele, pois de barata tonta estamos cheios.