27.6.05

Igrejas ricas, comunidades pobres

E viu também uma pobre viúva lançar ali duas pequenas moedas;

Lucas 21:2


Uma vez, uma jovem estava conversando comigo, e com orgulho desmedido, comenta que a torre da igreja dela (cristã protestante) é maior do que as torres das igrejas católicas no município onde ela mora. Ela também complementa que cada um daqueles tijolos de vidro usados em decoração custaram quase R$ 150 cada um. E usaram 70 ou 80 na fachada, acho.

Minha vontade foi virar para aquela jovem e dizer:E daí?. Grande coisa. Só que isso mascara um problema, relacionado às pessoas.

Sempre fui contra igrejas grandes. Na minha opinião, igreja com mais de 150 membros tem que ser dividida. Igreja é comunidade, não multidão. Como relacionar-se, olhar nos olhos das pessoas e ver a presença de Cristo, se você não conhece nem 10% da membresia, mesmo depois de anos na igreja? Para alguns é "excitante" conhecer gente nova na igreja todo dia, mas isso quebra completamente o preceito de comunhão entre as pessoas. Afinal, o que é uma ecclesia, senão uma comunidade? E como ser uma comunidade se você não conhece as pessoas?

Mas continuando... Temos as pessoas cada vez mais carentes, em tantos aspectos: Financeiramente é o aspecto mais comum, afinal desemprego é um problema no nosso Brasil. Mas as pessoas são carentes de afeto e carinho, muitas tem baixa auto-estima com isso. Falta muito cuidado, e falar que Deus os ama é muito estranho. Afinal, eles não vêem Deus...

Muitos pastores (graças a Deus não todos) tem uma goela de avestruz: O que tem no caixa da igreja, quer gastar. E na sua maioria, com obras e benfeitorias, de forma a registrar nos anais históricos, o seu nome como "aquele pastor que fez isso e aquilo". Muitos acham que isso é demonstrar que seu ministério é abençoado. Ledo engano.

As pessoas tem auto-estima baixa, mas se sentem melhores quando vão a uma igreja grande. Grande e bonita, diga-se de passagem. Muitas (como aquela jovem que citei em cima) acham que é um mérito a igreja ter um pináculo tão alto. Outros falam com orgulho: "É a minha igreja", como se isso fosse um mérito. E pastores arrancam centavos, reais e outras quantias da membresia que, embriagada com o templo, colocam ele como um fim, não como um meio.

Igrejas com escadas rolantes, projetores multimídia para o louvor, teclados Korg, baterias Pearl, guitarras Ibañez... Qual o fim nisso? Um teclado Korg cusa uns R$ 3 mil, uma bateria Pearl passa dos R$ 2 mil, uma mesa de som com 48 canais (enquanto não se usa nem 25) custa mais de R$ 5 mil. Afinal, vale a pena torrar o dinheiro da igreja nisso? Isso vai melhorar o louvor? Aliás, isso vai ser melhor aos olhos de Deus?

Não falo que deveremos ter guitarras, teclados e baixos, nem retroprojetores. Mas vem a pergunta: É realmente útil? Deus não está nem aí se o músico é fenomenal, o que importa é o seu coração, como aquele que ama ao Senhor e o louva com o talento que lhe foi dado. Então, por que não comprar uma boa guitarra (não precisa ser a melhor, mesmo porque o músico da igreja não é O MELHOR), uma boa bateria, um teclado jóia, um retroprojetor... Mas precisa mesmo de um piano Yamaha para acompanhar o cântico congregacional? Isso vai ajudar ao culto ser "mais abençoado"? Um projetor multimídia é realmente importante? Eu acho problemático, se isso vem apenas para satisfazer o ego da membresia, é melhor repensar tudo.

Quanto às igrejas... Já notaram que as igrejas maiores estão cada vez maiores, e as menores, ainda menores? As pessoas sentem-se alguém simplesmente pela sua igreja ser bonita, imponente ou influente politicamente. Mas e o q ela faz na comunidade? Ela é influente na comunidade? Ela ajuda as pessoas, mesmo as que não são cristãs? Ela é presente na vida do bairro, lutando por direitos ainda não alcançados? Ou é um castelo de beleza num meio de pobreza? Uma Bélgica cravada no meio da Índia?

Os cristãos que moram em comunidades carentes, quase todos descem o morro e vão congregar numa igreja grande, "no asfalto", embora tenham várias igrejas pequenas, comunidades e congregações perto da sua casinha humilde, talvez com melhor maneira de alcançá-los, de abraçá-los e tratar as suas necessidades. Mas muitos só sentem-se "gente" indo congregar no asfalto.

Deixa eu contar uma história: Conheço um homem que, junto com sua esposa, começou uma congregação em uma área carente, numa grande cidade brasileira. Área bem violenta também, eles com muita oração e trabalho iniciaram as atividades. Numa vez, veio um rapaz, membro desviado de uma igreja grande, sede de uma denominação imensa, distante muitos quilômetros da sua casa. Pediu oração para emprego. As pessoas se empenharam por aquela alma, oraram sem cessar, e apareceu a oportunidade de emprego. O rapaz reconciliou-se com Jesus (aleluia), deu uma oferta de gratidão para essa congregação... E correu para a outra igreja, a passos largos. Disse que agora ia "para uma igreja de verdade". O responsável confessou isso com muita raiva, e é justificada. Eu ficaria com raiva também, poxa! Tanta luta, tanta oração, e ouve isso de resposta?

Falta as pessoas se perceberem como filhas de Deus, inteira e completamente. Aí, não vai ser um baixo da Fender, uma fachada envidraçada ou ar-condicionado central que vão fazer eles se sentirem bem. Será a certeza no seu íntimo de serem amados pelo Senhor que fará eles amarem estar em comunhão com seus irmãos.

Quanto a gastar dinheiro com isso, por que não investir em bancar missionários evangelizando, fazer uma campanha nas redondezas da igreja, anunciar que Cristo salva a todos que puderem ouvir? Isso sim, é o que Deus quer que a verba seja empregada, não com benfeitorias que não levam a nada, apenas a inflar egos e esvaziar carteiras.



P. S.: Nada contra igrejas terem confortos. Quem conhece as igrejas Nova Vida sabe que toda INV tem porta de vidro blindex, ar-condicionado central e cadeiras acolchoadas. É um padrão para todas. Mas o problema é quando o conforto da igreja torna-se um fim em si mesmo, não um meio de alcançar pessoas.

P. S. 2: E não tem jeito, nada me convence que um teclado Roland vai ajudar mais o ministério de louvor do que antes. Antigamente chamavam a atenção batendo panelas, distribuindo folhetos e usando cones de papel na boca. Se for preciso, que façam isso tudo de novo, "Porque o Filho do homem veio buscar e salvar o que se havia perdido" (Lucas 19:10), e o nosso chamado é falar isso para todo mundo.


Deus tenha misericórdia da nossa igreja.

Igreja que desvirtua a Missio Dei

Porque, quando ainda estávamos convosco, vos mandamos isto, que, se alguém não quiser trabalhar, não coma também.

II Tessalonicenses 3:110


Não sou sociólogo, nem tenho a pretensão de sê-lo. Mas muitas coisas observo na igreja evangélica. Sou membro de uma igreja e participo dela ativamente. Mas visito outras igrejas por diversas circunstâncias, e fico observando... Ou como diria Robert Plant em Stairway to heaven: "It makes me wonder...".

Não é preciso ser estudioso das massas para saber que o culto de uma igreja em geral não é apenas um momento de manifestação eclesiástica, onde acreditamos, Deus está presente e participa daquele momento de louvor e adoração à Ele. Vai além disso, já que nem todo mundo que vai à igreja assiste ao culto: É o momento de rever os conhecidos, de fofocar, de realizar o que chamo de um acontecimento social dentro da comunidade. Afinal, pessoas se conhecem, fazem amizade, outras se apaixonam, namoram e casam, nascem e morrem.

Há alguma coisa de ruim nisso? Eu ainda não vi. Acho saudável. Mas isso nivela a igreja no patamar de um clube, uma escola, um grupo de amigos. Mas nós acreditamos que a igreja é algo bem maior, é a representante de Deus na terra, e tem por missão anunciar a salvação e a volta de Cristo, até que Ele venha. Só que muitos estão perdendo essa dimensão.

Infelizmente a igreja está cada vez mais fechada em si mesma, e cada vez mais achando que o reino de Deus resume-se à sua igreja local. Igrejas que olham para o próprio umbigo, não abrem os olhos. Com isso, as igrejas envolvem-se MENOS em ação social, em movimentos para-eclesiásticos, em lutas contra a injustiça, apenas com a desculpa de que estamos esperando o céu chegar.

Raios, o céu começa aqui! Se olharmos direito a Bíblia, é ordenança divina lutar por justiça social, cuidar das pessoas, defender os fracos, entender que Ele não se limita ás nossas quatro paredes! Tem vários versículos que corroboram isso, mas parece que as igrejas só querem ficar enfiadas em si mesmas adorando (critico o louvor pasteurizado depois). O nosso chamado é para mudar o mundo aqui e agora, não é dar um prato de comida ao carente e achar que estamos bem. É preciso lutar contra a pobreza, manifestar, protestar, chiar e principalmente orar. Orar muito, orar sem cessar. Orar até que as coisas mudem, e depois continuar orando. Nunca vi um culto mais vazio que o culto de oração de uma igreja. E nisso incluo todas, inclusive a minha. Tá, o horário é ruim, ainda estamos sonolentos, mas será que oramos em casa também. Não adianta só acharmos que a oração move as mãos de Deus, temos que crer nisso e fazê-lo.

Gosto da bronca de Paulo aos tessalonicenses que acham que deveriam esperar o Reino de Deus apenas. A vida não se resume a isso, mas parece que as igrejas estão cada vez mais assim, virando feudos murados, encasteladas nos seus templos (cada vez mais suntuosos), com medo do mundo, com medo de se contaminar. Acho que, se pudessem, muitos sairiam da Terra e iriam para Marte, ou alguma lua de Vênus, para lá "louvarem ao Senhor sem os mundanos por perto".

Será que, se a igreja sumisse da comunidade, as pessoas sentiriam falta? Façam alguma coisa, ou então peguem o documento de fundação da igreja e ensopem ele com batatas.

Lutero ataca pela primeira vez aqui

"Fiz uma aliança com Deus: que Ele não me mande visões, nem sonhos, nem mesmo anjos. Estou satisfeito com o dom das Escrituras Sagradas, que me dão instrução abundante e tudo o que preciso conhecer tanto para esta vida quanto para o que há de vir."

Martinho Lutero

Liberdade para fazer tudo e também para fazer nada

Quem conhece a liberdade
A quem o próprio Deus chamou
Não aceitará se submeter
A nenhuma escravidão

Doutores da Lei (Resgate)



Acho muito engraçado a pretensa liberdade que muitos alardeiam na igreja evangélica hoje em dia. Aliás, acho que a imposição dessa liberdade traz muitas vezes libertinagem (não no sentido sexual do termo), quando também acarreta bagunça.

Explico: É comum, nos momentos de louvor das igrejas hoje em dia falarem muito que temos liberdade perante o Senhor, e daí podemos nos manifestar livremente perante Deus, no momento de louvor. Agora, e no que isso acarreta problemas?


  1. Muitos entendem isso como um salvo-conduto para pagar mico perante Deus. E daí vem os exageros. Nada contra bater palmas, e louvar ao Senhor com elas. Mas assobiar, gritar, rodopiar e outras manifestações que listo abaixo, deixam de ser a presença do Espírito Santo para ser qualquer outra coisa. Em alguns casos, parece ser é coisa do capeta mesmo.
  2. As pessoas que dizem que tem o Espírito Santo (e fazem essa macaquice toda) acham que, quem não faz, não tem o Espírito Santo em suas vidas. Se a pessoa não canta, por exemplo (por diversos motivos), pronto, é frio espiritualmente, ou até é um enviado de satanás.
  3. E quem não faz, por diversos motivos, acha que o louvor é só cantado e/ou tocado, 3 ou mais coros no retroprojetor e acabou. Uns sentem-se culpados por não louvarem direito, como se fizesse diferença para Deus o louvor ser com panela batucada com colher ou baterias Pearl, órgão desafinado ou teclado Korg, e viola velha ou uma guitarra Fender Stratocaster. E essas pessoas sentem-se às vezes inferiorizadas. Tristes. Ficam mal mesmo.

Ou seja, perpetua-se uma cultura de comércio até no louvor: "vendemos" nosso melhor louvor, cheio de emocionalismos e filigranas espirituais, em troca de bençãos materiais do Deus Altíssimo, como se Deus precisasse de nós para realizar o seu propósito. Conversa fiada.

Vale a pena lembrar João 4:23: Mas a hora vem, e agora é, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito e em verdade; porque o Pai procura a tais que assim o adorem. Esse é o versículo mais usado como justificação para esses exageros. Só que a visão de louvor da igreja anda muito deturpada.

Louvor não é só cantar. Se o louvor fosse só isso, seria muito pobre. Louvamos a Deus com as nossas ofertas (momento mais do que negligenciado nas nossas igrejas), com os nossos dízimos (por mais que 70% em média da membresia não entregue o dízimo), com a nossa vida, com o nosso coração. Já vi críticas severas a uma pessoa próxima a mim que não canta por ser desafinado e não gostar. Mas ele louva com o seu coração, acompanha cada linha do cântico (ou coro) e louva no seu íntimo. Aliás, ele deve ter ficado mais tranquilo quando notou que o líder nacional da sua denominação também não canta, embora faça a mesma coisa que ele.

Como lidar com isso? Aprendendo a ser tolerante, aprendendo o que é realmente o que é o louvor. Vale a pena citar A Ditadura dos Tolerantes, do pastor Ricardo Gondim, sobre o exercício da tolerância. E também recomendar esse livro, do Rubem Amorese: Louvor, Adoração e Liturgia, da Editora Ultimato. São material excelente sobre o assunto. Ao contrário de Congressos de Louvor Profético que enchem hotéis em cidades interioranas e manifestações de Louvor Extravagante (está mais para Estrambótico), seria melhor se as pessoas preocupassem em entender realmente o que é o louvor.

Você pode estar perguntando-se: Mas como ser mais tolerante, se as igrejas estão tão fundamentalistas? É assunto para falar depois. Nenhum assunto está esgotado aqui, eles devem voltar depois.

Deus tenha misericórdia da sua (e nossa) amada igreja.